Cruzando o Oceano Atlântico

6 de dezembro de 2012, 7:00h da manhã....
...deixamos a Ilha do Sal ao amanhacer.
Baixa genoa, iça gennaker... para aproveitar melhor a brisa !!!
Esporte mais praticado, depois de velejar, é claro !!!
Micro peixe dourado.
Nove pássaros brancos... companheiros de viagem.
Ao fundo, ao longe, sob a névoa, o contorno da Ilha do Fogo.
Segundo por do sol da travessia.
Campeonato de canastra: homens x mulheres.
Renascido de uma gaiúta...
Amanhecer.
Rota 217°, vento 15 nós, velocidade 7,5 nós.
Adivinha o que temos para o almoço? Um belo atum...
Quatro dias depois... não somos os únicos por aqui !!!
As ondas longas nos fazem sentir como se estivéssemos voando !!!
Lugar preferido....
...para assistir ao espetáculo do sol se pondo todos os dias !!!
12/12/12: dia do fim do mundo !!! Primeira e única avaria de toda a viagem !!!
Tempestade chegando...
Chuva....
Ajustando velas a espera do "squall".
Divisões... céu e mar, chuva e sol !!!
Geladeira no mar... talvez estivesse cheinha de cerveja gelada !!!
Linha do Equador... comemoração e oferendas a Netuno...
...Veuve Clicquot ...
... e deliciosa crostata italiana.
Falta pouco agora.
E o gigante ficou para trás !!!
06 de dezembro de 2012
Latitude 16°45'18"N e Longitude 022°58'46"W
16:30h


Oceano Atlântico... um verdadeiro gigante !!! Desde que decidimos viver esta aventura, sabíamos que poderíamos levar a nossa casa e sermos levados por ela para os lugares mais lindos, exóticos e inspiradores, conheceríamos um sem número de pessoas interessantes, faríamos contato com muitas culturas diversas e, acima de tudo, carregaríamos todas estas emoções dentro de nós mesmos em um modo que só quem as vive sabe explicar ou descrever. Mal poderíamos imaginar que, menos de um mês depois de termos iniciado a viagem, já teríamos vivido, visto e sentido mais coisas do que o fazem um grande número de pessoas durante toda a sua vida. E a nossa aventura, mal tinha começado. Estávamos agora prestes a enfrentar mais um grande desafio... a travessia do Oceano Atlântico !!! Saindo de Cabo Verde, da Ilha do Sal, seguiríamos em rota direta para o Arquipélago de Fernando de Noronha... 1.340 mn nos separavam naquele momento da nossa terra, do nosso Brasil. Para nós, a travessia significava muito mais, significava chegar em casa e podermos dizer "estamos no Brasil... chegamos" !!!

Nos preparamos muito bem, agora tinha chegado a hora de levantar âncora, içar as velas e partir... o Oceano Atlântico se formou  a mais ou menos 200 milhões de anos, separa a África e a Europa que estão a leste das Américas que estão a oeste. Tem a forma de um 's', extensão de 16.000 quilômetros, profundidade média de 3.000 metros, emerge em alguns pontos formando ilhas como os Açores e está em constante modificação. As Ilhas Surtsey se formaram apenas em 1963 e, desde que Colombo descobriu as Américas, este continente já se afastou da Europa mais de 20 metros. É o segundo maior oceano do mundo e ocupa um quinto da superfície terrestre. Seu nome provém da mitologia grega, Atlas. A lenda nos diz que Atlas é um dos titãs gregos, capaz de personificar as forças da natureza causando caos. Os titãs atacaram os deuses do Olimpo, mas Zeus, líder espiritual dos homens e dos deuses, triunfante, castigou-os, condenando Atlas a carregar o peso do mundo e dos céus nas suas costas. Atlas é considerado o Senhor das águas distantes, razão pela qual o oceano além do Mediterrâneo recebeu o seu nome.

Então, a emoção começa agora... a travessia começa agora !!! Partimos cedinho, deixando a Ilha do Sal para trás, as 7:00h da manhã. Não sabemos se um dia retornaremos para cá. Porém, a alegria, a simplicidade e a recepcção calorosa com que esse povo nos recebeu, permanecerão para sempre na nossa lembrança. Ainda dentro da baía de Palmeira, içamos as velas... a todo pano. Mas o vento soprava fraco nesta hora e logo, substituímos a genoa pela charmosa gennaker vermelha. Assim, conseguíamos aproveitar melhor o ventinho. O mar estava tranquilo  e tínhamos as ondas longas do Atlântico a nosso favor. O trabalho de pescaria em equipe nos rendeu um minúsculo dourado, que os homens gentilmente cederam as mulheres para o almoço. A tarde, já com vento um pouco mais abundante, voltamos a usar a genoa. Recebemos a visita de nove pássaros branquinhos que estiveram conosco, melhor, ao nosso redor, por muito tempo. Esperávamos nestas primeiras 24 horas uma navegação bem mais movimentada, pois navegaríamos em meio as ilhas do arquipélago. Estávamos enganados. Tudo foi muito tranquilo. Já na manhã do dia seguinte, tínhamos a nosso boreste a Ilha do Fogo, uma das dez e a mais alta de Cabo Verde em virtude do vulcão, ainda ativo, de quase 3.000 metros de altura. E assim, dissemos adeus a Cabo Verde. Outro dia de navegação tranquila chegou ao fim, nos presenteando com mais um por do sol maravilhoso. Mais uma vez a gennaker nos ajudou a velejar mais rápido, em virtude dos ventos fracos. A calmaria se manteve no dia seguinte: pouco vento mas sempre a favor, assim como as belas ondas do mar. Nenhum sinal de civilização por estes mares, parece que somos os únicos por aqui. Bom para a tripulação, que aproveita para ler, rir, descansar, conversar, jogar... enquanto o lobo mau não vem.

Desta mesma forma seguiram-se os próximos dias... ventos de maior ou menor intensidade mas sempre favoráveis e com mares tranquilos. Netuno estava sendo muito generoso conosco, assim como Eolo, pois seguíamos sempre a vela, nada de motor nesta etapa. No quinto dia da travessia, conseguimos um belo peixe e, apenas no sexto dia é que encontramos outra embarcação... sim, existiam outras vidas transitando por estas águas além de nós e dos tantos peixes voadores que encontrávamos espalhados pelo barco todas as manhãs. A proa passou a ser o lugar preferido no barco, era de lá que admirávamos o espetáculo do sol se pondo a cada dia. Sempre único !!!

O sétimo dia da travessia mostrou ser o mais estressante... ainda de madrugada, antes mesmo de o dia clarear, meu capitão que estava fazendo o seu turno de navegação noturna, percebeu um problema no topo da vela mestra: estava solta, definitivamente alguma coisa tinha acontecido e a vela foi baixada. Por segurança, os motores foram ligados neste momento. Ao amanhecer, inspeção na vela para detectar o problema: o carrinho que fixa o punho da adriça ao mastro tinha se rompido. Várias conferências e nada, não tinha o que fazer. Teríamos que esperar chegar em terra para substituir a peça quebrada. O importante é que poderíamos continuar navegando e usando a vela grande, deixando sempre a adriça bem tensa. Depois da tradicional "sesta" vespertina, mais uma surpresa: os ventos alísios que agora sopravam como deviam, constantes, trouxeram consigo a primeira linha de instabilidade ou squall... em pouco tempo nuvens negras apareceram, a velocidade do vento aumentou muito e a possibilidade de que esta água caísse toda sobre nós também. Tudo acontece muito rápido, mas como vem, vai embora. Rapidamente, diminuímos as velas, fechamos todos as gaiútas e, em segurança, esperamos a trovoada passar. Que dia !!! Só então nos demos conta de que era 12/12/12... o dia em que o mundo deveria acabar. Será? O fato de que não vimos nem um sinal de civilização, aumentou as nossas suspeitas de que éramos a partir dali, os únicos seres humanos remanescente sobre a face terra !!!


Seguimos a rota traçada inicialmente: em linha reta para o Arquipélago de Fernando de Noronha. Desta forma, seguindo as estatísticas e as previsões meteo, teríamos sempre vento e corrente a favor, mar tranquilo com suas ondas longas e atravessaríamos a zona de convergência intertropical na sua faixa mais estreita neste período. Esta região está sempre perto da Linha do Equador, varia ao longo do ano e, é a região onde os ventos vindos de norte e sul se encontram. Geralmente eles são iguais em termos de força e, portanto, se anulam. Característica desta faixa, é a calmaria total e muito calor. Entretanto, tínhamos que ser cuidadosos, colocar a proa mais para oeste, nos dava uma navegação mais confortável, porém corríamos o risco de entrar na correnteza que leva ao Caribe. Não era o que queríamos, não naquele momento. Neste trecho, fomos mais uma vez surpreendidos: não pela calmaria, mas pela presença constante dos ventos. Muito bom. Só o mar que engrossou um pouco e nos fez balançar bastante por aproximadamente 48 horas. Foi neste trecho também, que encontramos boiando pelo mar o objeto mais bizarro de toda a viagem: uma geladeira !!! Bizarro por estar ali, no meio do mar !!!

A passagem pela Linha do Equador, a linha imaginária responsável pela divisão do globo em dois hemisférios: Norte e Sul, aconteceu exatamente as 06:05h no nono dia da travessia. Preparamos uma festa para Netuno: dividimos com ele uma crostata italiana deliciosa e um champagne. As seis da manhã !!! Acho que ele gostou. Depois disso, o mar se acalmou. A tradicional garrafa também foi lançada ao mar... agradecimentos, pedidos, oferendas, ofertas e nosso endereço eletrônico. Esperamos, de coração, que ela seja levada para uma praia e que quem a encontre faça contato conosco. Estávamos mais do que felizes... tínhamos chegado ao hemisfério Sul. Ainda falta muito para chegar em casa, precisamos chegar na latitude 26° e estamos navegando dentro da primeira. Chegaremos lá !!!

Dez dias no mar... a sensação era de já estar em casa. Faltava muito pouco agora. Chegamos em Noronha exatamente a 01:15h do dia 16 de dezembro. 10 dias, 18 horas e 15 minutos. Foram 1.340 mn percorridas em 258 horas e 15 minutos, navegando a uma velocidade média de 5.2 nós, 95% do tempo a vela.  


O gigante tinha ficado para trás !!!

3 comentários:

  1. Fazer o batismo na passagem pelo Linha do Equador sempre da sorte!!!!!

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  2. Que lindas narrativas vocês tem feito da travessia.
    Parabéns pelos relatos e pela coragem.
    Continuem escrevendo e estimulando nossos sonhos, que como os de vocês, voam sempre mais longe.
    Abraços,
    Paulo Ribeiro
    Veleiro Bepaluhê

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